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  • terça-feira, 14 de outubro de 2014

    IMPLOREMOS A DEUS PELOS FILHOS DE ABRAÃO (Jorge Hessen)

    Jorge Hessen

    Será que é legítimo analisarmos o conflito entre judeus e palestinos seguindo o pleito de quem chegou primeiro à região? Historicamente, os palestinos (antigos filisteus) estão naquelas terras muito antes de Isaque. Por esse aspecto, os judeus deveriam abandonar a Palestina e voltar a ser um povo errante, como era Jacó (Israel) e seus filhos, ou então deveriam pedir cidadania iraquiana e se fixarem no Iraque, local onde ficava a cidade de Ur, de onde saiu Abraão.
    A questão de utilizar o critério de quem chegou primeiro à região pode gerar dúvidas, pois em que pese os filisteus (antepassados dos atuais palestinos) habitarem aquela terra muito antes dos israelitas, é possível que outros povos tenham sido expulsos pelos filisteus a fim de tomarem o seu lugar. Destarte, os palestinos podem se basear no argumento, não de quem estava primeiro na terra, mas de quem a conquistou há mais tempo. O imbróglio da questão está aí, pois nesse caso, o direito passou para os judeus atuais, que conquistaram a terra após a Segunda Guerra tal como fizeram os palestinos no passado.
    De que maneira a humanidade atual poderá ajudar palestinos e Judeus a solucionar esses dilemas históricos? Seria através dos canais diplomáticos da ONU, da ação dos que lutam pela Justiça, pela Dignidade Humana, pela Paz? Enquanto não há solução imediata, eis quena pequena vila de Bilin, perto da capital Ramallah (Palestina), foi criado um jardim para homenagear os civis mortos durante os conflitos entre Israel e a Palestina. As flores são plantadas em granadas desativadas. Mohammed Khatib, um dos organizadores da vila onde o jardim foi construído, afirma que o objetivo é mostrar que a vida pode nascer também da morte. O uso de uma granada desativada como recipiente para plantas é uma ótima forma de chamar a atenção para uma região cansada de guerra e de perdas humanas dos dois lados.1
    Recordo que no dia 25 de maio de 1982, o Skyhawk, um caça-bombardeiro da Força Aérea Argentina, pilotado por Mariano Velasco, investiu contra uma embarcação militar inglesa deixando um saldo de 19 mortos. Dois dias depois, o também Skyhawk pilotado por Velasco foi abatido no Estreito de São Carlos, arquipélago no Atlântico Sul, por Neil Wilkinson, artilheiro antiaéreo no navio de combate HMS Intrepid da Inglaterra. O argentino sobreviveu ao saltar de paraquedas poucos minutos após ser atingido.
    Quase três décadas após o fim do confronto entre Argentina e Grã-Bretanha pelas ilhas Malvinas2, os dois ex-inimigos de guerra viveram um encontro emocionante. "Meglio tardi che mai” – como diz o provérbio italiano ("Antes tarde do que nunca"), Mariano Velasco recebeu em sua casa na província de Córdoba, para um magnificente banquete, o veterano artilheiro inglês Neil Wilkinson. Atualmente são amigos e se correspondem com certa frequência por e-mail, Facebook ou Skype.
    O episódio inevitavelmente nos remete para reflexões sobre a guerra. Qual a base lógica que justifica uma guerra? Os Benfeitores do Além admoestam que a guerra é a “predominância da natureza animal sobre a natureza espiritual e satisfação das paixões”.3 No transcurso da guerra, predominou entre Velasco e Wilkinson a índole selvagem sobre a espiritual. Hoje, 30 anos depois, a situação é inversa entre os dois ex-combatentes inimigos do front de batalha.Infelizmente, o “caso Velasco/Wilkinson” é uma raríssima exceção, pois nem sempre esse é o desfecho entre ex-inimigos de guerra.
    Onde se encontram os valores morais da sociedade contemporânea? Muitas religiões estão amordaçadas pelas injunções de ordem econômica e política. A Doutrina dos Espíritos tem efetuado o esforço hercúleo de sustentar acesa a luz da crença nas plagas iluminadas da razão, da cultura e do direito. Embora seja “o esforço do Espiritismo quase superior às suas próprias forças, o mundo não está à disposição dos ditadores terrestres. Jesus é o seu único diretor no plano das realidades imortais.”4
    Cremos que judeus e palestinos podem conviver, no respeito recíproco, trocando o fuzil pelo magnificente banquete, transmutando a exclusão pela partilha, alterando a incompreensão pela tolerância. Quem sabe a Doutrina dos Espíritos, nessa conjuntura, possa levar-lhes a Mensagem do Evangelho, consubstanciada na lei do amor, da fraternidade, do perdão, da reencarnação, da comunicabilidade dos desencarnados, transformando gradualmente as leis de Moisés e Maomé, justificados pela lei de talião (olho por olho, dente por dente), que têm gerado cada vez mais ódio sobre ódio, tal como estamos assistindo no proscênio dessa estúpida guerra do Oriente Médio!
    Anota Emmanuel que "épocas de lutas amargas, desde os primeiros anos do século XX, a guerra se aninhou com caráter permanente em quase todas as regiões do planeta. A Liga das Nações, o Tratado de Versalhes, bem como todos os pactos de segurança da paz, não têm sido senão fenômenos da própria guerra.”5 Sem tolerância, toda fé se resume em adoração inútil; a paz não passa de uma flor incapaz de frutescência e a própria solidariedade se circunscreve a um jogo de palavras brilhantes, em torno do qual judeus e árabes costumam parecer pronunciando maldições. Jesus, um excelso filho da região, declarou que nos daria a sua paz, que deixaria para nós a sua paz, e neste instante em que filhos de Abraão se destroçam, são válidas todas as fórmulas (políticas, econômicas, sociais, religiosas) para a busca da paz entre eles.

    Referências bibliográficas:
    [2] Falklands (para os britânicos)
    [3] Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos, Rio de Janeiro: Ed FEB, 2000 Perg. 742
    [4] Xavier, Francisco Cândido. A Caminho da Luz, ditado pelo Espírito Emmanuel, Rio de Janeiro: Ed FEB, 1976

    [5] idem